Biomimética: a ciência por trás da coleção Biomas
Um dos temas mais importantes abordados na coleção Biomas, cocriação entre Decortiles e o Atelier Marko Brajovic, é a relação do ser humano com a natureza.
Para ampliar o conhecimento, o arquiteto Marko Brajovic contou com a parceria da bióloga e biomimética, Alessandra Araújo, fundadora da bio-inspirations e designer de inovação em segmentos corporativos, que elaborou uma pesquisa sobre as complexidades existentes na diversidade brasileira.
O estudo abrangeu temas como: bem-estar, saúde, cidades, geologia e sentimentos, com resultados que tentam compreender as interações humanas com “as peles do Brasil”, terno usado para se referir aos biomas. Para você entender melhor o desenvolvimento criativo da coleção, entrevistamos a bióloga, que explica os bastidores por trás dos produtos.
1 – O que é biomimética?
AA: A biomimética é uma ciência e uma prática. Como ciência ela estuda as estratégias e os mecanismos de como que a natureza e todos os seus organismos há 3.8 bilhões de anos conseguem sobreviver e reproduzir. Como prática, é uma prática de inovação, que traça com maior profundidade, a relação entre o problema a ser resolvido e as respostas que podem ser encontradas na natureza. A biomimética busca entender como se estabelece essa interação, se inspira nesse organismo, e a partir daí, aplica esse princípio no design a ser desenvolvido. Por isso, que a biomimética é uma inovação não só da forma pela forma. Não é um telhado em forma de folha, por exemplo, mas sim, entender a folha como estratégia, como função.
2 – Qual a importância da biomimética para o contexto das cidades e do morar?
AA: A importância da biomimética para a vida contemporânea é fundamental em todos os aspectos de sustentabilidade e de regeneração, porque a biomimética está relacionada aos princípios de como que a vida cria condições propícias para dar continuidade à vida, o que rege a capacidade da vida de se manter viva e gerar mais. Tudo que é criado ou construído através da biomimética são processos e produtos que tem como conceito a continuidade da vida, ou seja, não gerará resíduos perigosos, não gerará produtos que tem uma vida útil curta, que demande de muita energia ou que danifique o meio ambiente.
Para o contexto urbano e por uma questão de saúde, o que as cidades precisam é regenerar os espaços, porque as metrópoles crescem rapidamente e numa velocidade muito grande, consequentemente sendo grandes cadeias poluidoras para criar e manter seus espaços construídos. Então, ter como princípio a biomimética é ir além dos critérios básicos de sustentabilidade ou de alguma legislação existente.
3 -Como foi o processo de pesquisa para o desenvolvimento da coleção Biomas?
AA: O processo de pesquisa e inspiração para a criação da coleção Biomas foi superinteressante. Nós não começamos olhando para as tendências ou para necessidades urbanísticas. Fizemos o caminho inverso. Olhamos para necessidades humanas e nos questionamos como as pessoas se relacionam nessas áreas urbanas. Estudamos também uma série de patologias, que são oriundas das metrópoles, e toda essa relação do ser humano com os sentidos. Olhamos para a litografia do Brasil, os tipos de solo, as topografias e a partir disso, começamos a desenvolver um estudo sobre cada bioma. Assim, tentamos interpretar as cores, as texturas, as mensagens e as identidades predominantes que poderiam ser decodificadas em algo físico e estabelecer essa conexão do humano com o natural.
4- Quais os desafios para esse projeto?
AA: Os desafios foram muitos! Um dos primeiros era identificar como traríamos a essência de cada bioma, já que eles têm uma identidade tão rica em sua essência e que é quase impossível de calcular. Depois, pensamos nas principais características desses biomas que pudessem ser percebidos à primeira vista. A partir daí, o desafio foi fazer com que os produtos mantivessem a identidade daquilo que foi observado e depois transformado em cerâmica. Eu acredito que através desse trabalho em específico e da profundidade da pesquisa, conseguimos trazer peças que não são só um reflexo ou uma imitação artificial, mas sim, revestimentos conectados com os sentidos e as origens dos biomas.
5 – Qual sua opinião sobre o movimento “biofílico” que tem se tornado uma grande tendência na arquitetura?
AA: A biofilia é também sobre entender como que o ser humano ocupa os espaços. Se voltarmos no tempo, a humanidade sempre viveu em ambientes muitos abertos e com uma complexidade visual, que se difere dos espaços construídos hoje em dia, lotados de ângulos de 90°, com iluminações artificiais e texturas lisas. Essa diferença visual não condiz com a nossa história evolutiva. E, como que nós podemos habitar esses espaços? Como eles podem ser mais saudáveis? Eu sou bióloga de formação acadêmica e o que Eu penso, é que a biofilia faz essa ponte entre ciência e arquitetura, entre ciência e engenharia, entre ciência e construção civil, porque nós ganhamos muito mais quando cruzamos esses conhecimentos.
6 – Como você enxerga a propagação da biomimética daqui há alguns anos?
AA: A biomimética como ciência e prática só tende a aumentar. Ela é uma ciência relativamente nova como disciplina e pesquisa, mas faz parte da vida do ser humano desde sempre. Nós habitávamos o Planeta Terra antigamente de uma forma muito biomimética, desde a agricultura até as primeiras construções antes do surgimento da energia elétrica. Os nossos olhares eram ajustados de acordo com a natureza, com um fluxo natural do estado das coisas. E, conforme avançamentos, as ciências como a biomimética precisam estar cada vez mais presentes, assim como seu conhecimento para desenvolver novos materiais, novas formas de construir e novas formas de viver.